1. Basicamente, uma sitcom é uma série de comédia com episódios semanais de cerca de 20/30 minutos, três ou quatro cenários, gargalhadas gravadas ao vivo ou acrescentadas na pós-produção e personagens fixas que reagem a diferentes situações de uma forma que se torna previsível à medida que conhecemos as suas personalidades. Com este material simples (ou a alternativa de fazer tudo em animação), é possível obter o melhor e o pior, dependendo do talento dos actores, da imaginação dos argumentistas, da empatia entre o público e as personagens ou do registo do espírito do tempo no qual é produzida. Apesar do formato estar algo ultrapassado hoje em dia, as melhores sitcoms conseguem ultrapassar os seus aspectos mais datados e chegar a diferentes gerações, como é visível no “regresso” de Friends.
2. Não há grande discussão sobre o facto de Seinfeld ser a melhor sitcom de todos os tempos. Basta recordar o episódio que termina com um George desesperado a bater no chão enquanto Jerry comenta: “And you wanted to be my latex salesman…” Se isto não é perfeição, não imagino o que será.
3. Quanto à melhor personagem de sempre de uma sitcom, ainda é difícil contornar a figura de Archie Bunker, o protagonista de All in The Family (Uma Família às Direitas, em Portugal), talvez porque o espantoso desempenho de Carroll O’Connor vá além da caricatura de uma forma de ver o mundo dominada pela ignorância e pelo preconceito e mostre um homem que lá no fundo tem bom coração e teme a mudança acima de tudo. Claro que a série recebeu um novo olhar com a influência política obtida nos últimos anos pelos Bunkers deste mundo.
4. O público-alvo de Dois Homens e Meio é igual às personagens principais da série: homens com demasiado tempo livre. E por isso, que remédio, de vez em quando lá estou a ver Charlie Sheen a insultar a mãe, o irmão e o sobrinho.
5. Depois de uma primeira temporada com várias arestas por limar, Friends melhorou muito e manteve-se estável em termos de qualidade até ao fim. Para lá dos diálogos cuidadosamente urdidos, os argumentistas da série passaram com brilhantismo sucessivos testes onde as coisas poderiam ter corrido muito mal e desenvolveram personagens cuja evolução preserva o interesse e a simpatia do público. Sim, hoje (tal como há 20 anos) Friends parece demasiado branquinha, mas, se formos atrás de todas as sitcoms da mesma época, não faltarão bruxas para caçar.
6. A Teoria do Big Bang, uma das sitcoms do vasto catálogo do produtor Chuck Lorre, pecou por ter umas quatro temporadas a mais, levadas aos ombros pela esquisitice de Sheldon (Jim Parsons) quando as outras personagens já se encontravam há muito esgotadas. Contudo, foi no início, especialmente na segunda e terceira séries, uma das sitcoms mais eficazes e divertidas surgidas no século XXI. Apesar de tudo o que Mayim Bialik e Melissa Rauch acrescentaram ao projecto, A Teoria do Big Bang funcionava um pouco melhor quando se limitava ao conceito “uma boazona e quatro paspalhões”.
7. O idiota, aquele cuja lentidão lisonjeia a inteligência do espectador, é uma figura clássica do universo das sitcoms, mas dentro dessa espécie de personagens existem numerosos subtipos. Há o idiota bonzinho (Joey Tribbiani, Friends), o idiota que se está nas tintas (Jake Harper, Dois Homens e Meio), o idiota manipulado por alguém mais inteligente (Américo Rocha, A Mulher do Senhor Ministro), o idiota que estraga tudo (Baldrick, Black Adder), o idiota que resolve as coisas no fim (Homer Simpson, Os Simpsons), a cópia do idiota que resolve as coisas no fim (Peter Griffin, Family Guy)… Em geral, o idiota desperta simpatia pela inconsciência da sua estupidez e por ser demasiado ingénuo para ser maléfico. Para saber mais sobre idiotas e outras personagens de sitcoms, consulte o livro Escrever para Comédia, de Susana Romana (Cego Surdo e Mudo, 2013).
8. Já poucos se lembrarão de que em 2001 Trey Parker e Matt Stone, os criadores de South Park, lançaram a sitcom em imagem real That’s My Bush (a SIC Radical chamou-lhe Bush Amigo), com Timothy Bottoms no papel do novo presidente George W. Bush. Para lá do humor político, o projecto era sobretudo uma paródia às histórias e personagens típicas das sitcoms: o vizinho intrometido, a empregada respondona, a sucessão de equívocos, o tipo que tem de estar em dois lugares ao mesmo tempo, etc. Na verdade, mesmo ao dirigir actores de carne e osso, as mentes de Parker e Stone estavam formatadas para a animação e o resultado final de That’s My Bush foi insatisfatório, levando ao cancelamento da série ainda antes do 11 de Setembro. Valeu pela intenção de satirizar todos os clichés que, se não forem reinventados, transformam qualquer sitcom numa valente estopada.
9. Durante muito tempo, a Britcom foi uma autêntica instituição dos sábados à noite. Para lá de duplas cómicas (Smith & Jones, French & Saunders), programas de sketches (Big Train, The Fast Show, Goodness Gracious Me) ou produtos difíceis de classificar (Little Britain, League of Gentlemen), a produção humorística da BBC oferecida aos espectadores da RTP2 incluiu sitcoms tão diferentes como My Hero, Hippies, My Family, Coupling (Friends com mais sexo), The Office, Black Adder, Yes, Minister ou Absolutely Fabulous. No entanto, há sempre um carinho especial por Allo, Allo, a série com uma visão muito particular da ocupação de França pelos nazis. Actualmente, alguns reparam que o humor do café do René é de teatro de revista; pois será, mas tem piada na mesma, tal como o vaivém de acontecimentos que se sucedem em cada episódio, disfarçando o facto de tudo estar quase sempre na mesma. Nesse sentido, Allo, Allo parece-se muito com a política portuguesa.
10. É curioso recordar agora como na década de 90 os canais portugueses estavam a abarrotar de sitcoms, entre as importadas e as nacionais. As últimas incluíam adaptações de clássicos americanos (Nico d’Obra, Marina, Marina, Sozinhos em Casa), o humor tripeiro do Centro de Produção do Porto da RTP (Clube Paraíso, Os Andrades), os veículos para Camilo de Oliveira ou, a partir do sucesso da brasileira Sai de Baixo, produções gravadas com uma plateia a assistir (Santos da Casa, Bacalhau com Todos). No meio disto tudo, as peripécias de Lola Rocha imaginadas por Ana Bola em A Mulher do Senhor Ministro e A Senhora Ministra eram o esforço mais criativo, embora eu não fosse grande fã. Pouco a pouco, as sitcoms lusas começaram a rarear, o que reforçou a singularidade de Nelo & Idália, uma experiência de Herman José no género transmitida pela RTP1 entre 2015 e 2016. De facto, o humorista deu um toque pessoal ao seriado, indo além do infeliz casal do título ao alargar o rol de bonecos interpretados por Herman e Maria Rueff e convidar outros membros do bando para participações especiais. Os restantes trabalhos na área pareceram sempre demasiado simplistas, antiquados ou sem capacidade de propulsão (Pôr do Sol não é exactamente uma sitcom). O que foi não volta a ser?
As origens (1920-1945): As características rurais mantidas pelo território do actual município de Odivelas na primeira metade do século XX contribuíram para que o aparecimento do desporto local registasse uma dinâmica inferior à dos pontos mais industrializados da periferia de Lisboa. Os primeiros clubes surgidos no espaço em questão mantiveram actividades irregulares, limitadas pela falta de meios e com um escasso registo documental enquanto dois estabelecimentos de ensino singulares, o Instituto de Odivelas e a Escola Agrícola da Paiã, incentivavam a prática desportiva dos seus estudantes e proporcionavam-lhes infra-estruturas raras na área envolvente dos internatos. Entretanto, numa fase de popularização do ciclismo durante a qual o concelho de Loures era frequentemente percorrido por corridas velocipédicas, alguns ciclistas odivelenses, como João Francisco e José Ferreira, obtiveram projecção nacional.
O desporto num território em transformação (1945-1974): A fundação definitiva do Odivelas Futebol Clube e a construção por este de um campo reservado à prática do futebol, juntamente com a participação do Odivelas FC e do CD Caneças nas competições distritais da AFL a partir da época de 1953/54, deram ao desporto odivelense a estabilidade que lhe faltava, mas o contexto social que rodeava os clubes sofreu profundas alterações nas décadas de 50 e 60. O fluxo demográfico com destino à capital e o fenómeno da suburbanização levaram a um crescimento populacional súbito na antiga zona saloia acompanhado pela expansão descoordenada de conjuntos habitacionais cuja precariedade foi denunciada pelas cheias de 1967. Surpreendidas pela rapidez da mudança, as autarquias falhavam na criação de equipamentos colectivos, incluindo os de âmbito desportivo. Mesmo assim, e apesar do número relativamente reduzido de clubes federados então existentes nas freguesias de Caneças, Odivelas e Póvoa de Santo Adrião, grupos de jovens formavam equipas para competir nos torneios do chamado “futebol popular”, enquanto experiências como os Jogos Juvenis da Pontinha promoviam a actividade física junto das crianças.
A expansão do associativismo (1974-1998): Após o 25 de Abril, o incremento da participação cívica, o fim das restrições ao direito de associação e os estímulos dos poderes local e central à democratização da prática desportiva originaram um aumento significativo do número de clubes portugueses. Na área geográfica aqui em análise, o crescimento da rede associativa tornou-a mais adequada à nova densidade populacional e permitiu uma diversificação das modalidades praticadas com o desenvolvimento de iniciativas ligadas a desportos como o andebol, o atletismo, o basquetebol ou o hóquei em patins. Contudo, os dirigentes das colectividades queixavam-se de obstáculos ao funcionamento destas, entre eles a escassez de espaços disponíveis para treinos e jogos, os insuficientes apoios autárquicos ou o desinteresse da maioria dos odivelenses pela vida dos clubes locais. A construção de equipamentos como o Estádio Arnaldo Dias ou as piscinas municipais de Odivelas não travou a ambição de um maior destaque, ao nível quer dos resultados quer do número de praticantes, da actividade desportiva no território que se separaria em 1998 do município de Loures.
Dos grandes eventos à prática informal (1998-2020): Os autarcas do Partido Socialista que geriram a Câmara de Odivelas desde a criação do município seguiram uma política desportiva marcada pelo objectivo de construir instalações aptas a acolher provas nacionais e internacionais de diferentes modalidades cuja organização reforçaria o prestígio do concelho, sublinhando uma identidade própria distinta do estigma do subúrbio lisboeta. Os novos equipamentos municipais visaram também incentivar a prática informal, num período em que o exercício físico em especialidades como a natação, a ginástica ou o atletismo passou a realizar-se crescentemente sem enquadramento clubístico. A rede de colectividades não deixou, no entanto, de se expandir, embora a um ritmo mais lento, em ligação com as novas zonas urbanas (Jardim da Amoreira, Colinas do Cruzeiro, etc.) e com o polémico desaparecimento do Odivelas FC a deixar um vazio por preencher. O estatuto de Cidade Europeia do Desporto assumido por Odivelas em 2020 visou assinalar os avanços registados nas décadas anteriores, mas a pandemia de covid-19 veio prejudicar a iniciativa e suspender temporariamente grande parte da actividade desportiva concelhia.
Um café simples e popular, mas eu gosto dele assim. O medo da falta de memória. De repente, ficou lentificado. O meu sobrinho alfabetizado e a minha sobrinha doutora. O calor do dia de Santo António. O Testículo e o testículo. Dizer “isso custa o quê?!” Ouvir “isso custa o quê?!” O que posso fazer se o preço aumentou 25% desde o início do ano? Os amigos socialistas de Clara Ferreira Alves que vivem no tal bairro sem prisões nem hospitais. Só posso falar mascarado. O Zé Pedro, um herói. Pertencer a um clube com 7 milhões de sócios ou algo mais? Friends, uma série muito bem escrita. Preocupar-me com a saúde de Marco Paulo sabendo que o homem é uma diva. À esquerda da Alameda começa outro mundo. A alegria da dádiva. 1 euro por um romance de Margarida Rebelo Pinto. A pança imensa. A senhora que ficou fora de si com as árvores à frente de casa. Prefiro não saber o que acontece na casa de banho. Os episódios por ouvir dos podcasts acumulam-se. Qual é a lei deste animal? Não havia cheias assim desde os anos 90. Seja para falar bem ou mal, ninguém se cansa de tanto Ronaldo? Virar a cabeça para ler as legendas dos discursos de Zelensky. Tudo se move, tudo sempre na mesma. Os centros culturais não têm a obrigação moral de acolher o espectáculo de João Baião. José Milhazes já era famoso, mas agora é uma popstar. As pessoas não querem falar do que aconteceu “durante a pandemia”. Tanto caos, tão pouco CAOS. Ninguém precisa saber do táxi. O fim do mundo sempre ao virar da esquina. A maioria absoluta, uma série de televisão. Não fotografei a varanda com uma bandeira do Benfica. O Natal é tão pouco e é tanto. Consultar uma bobine em três dias. Serei mesmo um divulgador da História? As análises podem ser perigosas. O Instagram não é a rede mais adequada para trocar ideias. A falta de anestesistas no Hospital Beatriz Ângelo. Rui Ramos a contar como Salazar era bonito e simpático. Novas formas de protesto ameaçam os slogans que rimam do PCP. Deixa-me adiar. Pelo menos Francisco Martins Rodrigues não se julgava um génio num país de idiotas. Todos os partidos em lugares confortáveis. A bolha tornou-se o maior cliché da bolha.
E continuo sem beduínos a quem perguntar se seria Ramadão.
Ao contrário do que se possa pensar, o humor nonsense de Pôr do Sol, a série agora finda da RTP criada pelo argumentista Henrique Dias, pelo realizador Manuel Pureza e pelo actor Rui Melo, não é propriamente uma novidade na televisão portuguesa. Outros projectos escritos na última década por Dias, em parceria com Roberto Pereira e Frederico Pombares, também recorreram à introdução de elementos estranhos num contexto familiar ao espectador e buscaram a comicidade através do exagero, do absurdo e de referências inesperadas a figuras da cultura pop. Em 2019, já na RTP, Dias, Pureza e Melo estiveram ligados a Desliga a Televisão, uma espécie de O Tal Canal do século XXI que parodiava, além das novelas, concursos, reality-shows e outros formatos das estações nacionais. No entanto, sentia-se sempre que os diálogos com imensa graça no papel soavam apenas esquisitos ao saírem das bocas dos actores, enquanto faltava um esquema coerente que desse sentido ao disparate para lá dos sketches sem continuidade.
Mais tarde, em 2021, o director de programas da televisão pública, José Fragoso, aceitou a ideia da “novela” centrada na Herdade do Pôr do Sol, que estreou em Agosto (um mês no qual os canais generalistas entram em pousio), com escassa publicidade e aparentemente sem perspectivas de sucesso superiores às de muitas outras séries de diferentes géneros exibidas a seguir ao Telejornal. E, no entanto, um ano depois, aqui estamos, com o derradeiro episódio de Pôr do Sol a ser visto na televisão, na Internet e em várias salas de cinema por um público fiel e entusiasta que sente estar a viver um momento único. Como é que isto aconteceu numa época em que as surpresas pareciam impossíveis na televisão lusa? Em primeiro lugar, obviamente, através das redes sociais, local privilegiado do boca-a-boca e da partilha quer de vídeos quer de imagens da série com as frases das personagens em rodapé, tornando-se o “tens de ver isto” a melhor forma de divulgação. A plataforma RTP Play, onde Pôr do Sol é o programa mais visto de sempre, deu ao projecto uma vida muito para além da transmissão convencional e atraiu uma larga porção de novos espectadores entre os Agostos das duas temporadas, além de garantir a durabilidade do produto, mas tudo isto poderia ter acontecido com outra série, pelo que há que analisar a composição da poção mágica.
A qualidade do argumento constitui um dos principais trunfos de Pôr do Sol, dotada de uma história disparatada mas habilmente construída, personagens exageradas mas que não são bonecos e um ritmo lento mas com novidades em cada episódio. A série realizada por Manuel Pureza, cada vez mais arrojado ao longo dos 36 episódios, veio responder à necessidade de uma paródia às telenovelas actuais que referisse e desmontasse todos os clichés destas sem perder o respeito e carinho pelo formato satirizado. Aqui entra o factor que resolveu o problema verificado noutras aventuras dos argumentistas: a experiência do elenco em novelas, que permite aos actores dizer as suas falas absurdas com o ar mais sério e convicto do mundo. Embora todos os intérpretes estejam em bom nível, é justo destacar que Rui Melo (Simão) e Gabriela Barros (as gémeas Matilde, Filipa e Salomé) levam a série às costas com desempenhos espantosos. A banda sonora, dividida entre um Toy que não nos sai da cabeça, os temas em inglês macarrónico dos Jesus Quisto e a música muito carregada que assinala os momentos mais “dramáticos”, revela-se também essencial para a identidade de Pôr do Sol. No meio do turbilhão de piadas lançadas, aquelas que falham o alvo são insuficientes para comprometer um todo onde a vastidão do universo de referências permite a qualquer espectador encontrar algo com que se identifique. À semelhança dos melhores programas de Herman José (que nunca aparece em Pôr do Sol mas está sempre lá), esta comédia soube parar no momento certo e atingiu a intemporalidade por não ter medo de ficar datada.
Nas revistas de televisão, a crítica tem abordado Pôr do Sol com simpatia, mas também com a condescendência reservada a um programa de nicho visto apenas por miúdos ligados ao mundo digital e não pelas grandes e ignaras massas que seguem os conteúdos líderes de audiências. Além da heterogeneidade do público da série (vista em conjunto por numerosas famílias) ser maior do que se julga, é preciso ter em conta que, com o crescente êxodo de telespectadores dos canais generalistas para o cabo, todos os programas feitos hoje em dia em Portugal são vistos por minorias, independentemente da dimensão destas. Ao fim e ao cabo, quantas pessoas conhecem boa parte das personalidades que enchem as páginas das revistas? O deslize dos autores de Pôr do Sol foi não terem partido do princípio fundamental na nossa televisão de que o público é estúpido. Assim, as audiências da paródia comparam mal com as das novelas “a sério”, mas quando daqui a 20 anos, depois de muitas coisas e pessoas mencionadas na série já terem desaparecido, alguém referir numa conversa os Bourbon de Linhaça, o cavalo Testículo ou o colar de S. Cajó, haverá sempre outro alguém a saber do que se trata e a sorrir com a recordação.
1. Porque o partido disponibilizou online os números do Avante! e de outros jornais comunistas publicados na clandestinidade entre 1931 e 1974, fontes essenciais para o estudo da oposição ao Estado Novo. O problema é que, recentemente, passou a ser necessário comprar ou assinar o Avante! para obter a senha de entrada (alterada todas as semanas) no site que aloja as edições clandestinas. No meio do esforço legítimo do PCP para restringir o acesso à sua propriedade privada, a antiga ferramenta de pesquisa desapareceu, dificultando a investigação a quem não busca uma data específica.
2. Porque existe uma grande coerência no PCP e tudo o que o partido fez e disse desde 24 de Fevereiro era previsível. O problema é que as posições comunistas sobre política externa são afectadas por tiques como teorias da conspiração, anti-americanismo primário ou excessos de maniqueísmo que, contraditoriamente, aproximam o PCP dos governantes menos recomendáveis. Tudo isto já surgira nos últimos anos a propósito de Cuba, da Síria, da Venezuela ou da Bielorrússia, mas tratava-se de questões distantes da política do dia-a-dia em que as posições dos comunistas portugueses facilmente passavam despercebidas. Claro que o PCP não apoia Vladimir Putin e os seus comunicados incluem sempre uma crítica ao regime russo, feita no mesmo parágrafo onde a direcção de Jerónimo de Sousa afirma que também não gosta de chanfana, de música country e da facilidade com que se assinalam penáltis no futebol português. Os outros parágrafos são preenchidos com críticas à Comissão Europeia, à Administração Biden e a tudo o que seja “nosso”, ou seja, pertença a um capitalismo eterna e inevitavelmente malévolo. Na verdade, o que o PCP gostaria era de poder regressar ao tempo em que O Diário estava nos quiosques e o mundo era simples e compreensível.
3. Porque há no PCP várias pessoas com as melhores intenções segundo as quais basta dizer “Paz sim, guerra não” e condenar as sanções à Rússia e o fornecimento de armas à Ucrânia para favorecer a resolução do conflito ou, pelo menos, ficar numa posição em que não se tenha culpa de nada. O problema é que, como diria o general Vasco Gonçalves, aqui não pode haver neutros. O precedente criado pelo ataque da Rússia à Ucrânia e as atrocidades cometidas pelas tropas russas (cauteloso quanto à autoria dos massacres, o PCP admite a hipótese de surgirem no futuro provas a incriminar a cantora Tonicha) são demasiado graves para se supor que existem nesta guerra duas partes equivalentes a quem basta sentar à mesa de conversações para chegarem a um acordo racional que satisfaça os interesses de ambas. O raquelismo-varelismo, ligado à “história dos resistentes”, admitiu que, para chegar à paz, a Ucrânia deveria simplesmente render-se e aceitar todas as exigências da Rússia. Se o PCP acredita numa solução semelhante, há que clarificá-lo.
4. Porque o ambiente emocional e a sensação de perigo criados pela invasão da Ucrânia facilitam um discurso de “caça às bruxas” por parte da direita que, visando em primeiro lugar o PCP, depressa atingirá o Bloco (para muita gente, é tudo a mesma coisa) e, pouco depois, o PS. O problema é que, para o PCP, qualquer crítica pode ser reduzida a anticomunismo. Ainda para mais, quem está em minoria nunca teve tanta facilidade em arranjar justificações para gritar insultos aos numerosos idiotas que insistem em conduzir em contramão. Basta pegar no telemóvel e procurar a informação “certa” enquanto a outra mão segura o volante. Entretanto, há que denunciar o risco em que todos aqueles veículos no lado errado da estrada colocam o condutor responsável. Integrado no espírito do tempo, o PCP já dispensou o sentido das proporções e está apto a denunciar em todo o lado a censura, o pensamento único e a criminalização do pacifismo. Afinal, resistir no Twitter não é muito diferente de resistir na prisão.
5. Porque os militantes comunistas receiam que, se o partido alterar uma vírgula no seu discurso ou modificar a sua organização interna, deixará de ser o PCP para se tornar outra coisa qualquer. O problema é que a estabilidade actual tem produzido efeitos cada vez mais nocivos, limitando a influência da organização centenária aos cerca de 4% dos eleitores que se mantém fiéis em quaisquer circunstâncias e garantem que, ao contrário do CDS, o PCP não desaparecerá de um momento para o outro. No seu último livro, o dissidente Domingos Lopes constata o óbvio: o facto de nem o secretário-geral nem qualquer outro dirigente do PCP se demitirem, por piores que sejam os resultados eleitorais, cria entre os quadros um “ambiente de pouca exigência” propício à acomodação e à busca de causas exteriores para tudo o que corre mal. Lopes acredita que o seu antigo partido poderia mudar se analisasse criticamente o legado de Álvaro Cunhal e corrigisse os aspectos negativos do modelo deixado pelo antigo líder. Talvez fosse possível, mas criticar Cunhal parece ser dentro do PCP uma daquelas blasfémias cuja mera enunciação abalaria a coesão do grupo. Seria como se, numa assembleia-geral do FC Porto, um sócio admitisse no seu discurso a hipótese de Pinto da Costa alguma vez ter violado a lei na sua vida.
6. Porque é verdade que o tom da comunicação social é geralmente desfavorável ao PCP, com poucos comentadores comunistas a acederem a tribunas públicas. O problema é que, além de se queixar todos os dias da “campanha anticomunista” dos media, o PCP poderia tentar compreender em que medida contribuiu para esse isolamento. Afinal, todos os partidos procuram influenciar a comunicação social a seu favor e um fracasso nessa área deve-se pelo menos em parte aos próprios interessados. Pinto Balsemão e os outros patrões dos media não gostam dos comunistas? É mais provável que, como José Pacheco Pereira escreveu certa vez, os jornalistas mais jovens tenham muita dificuldade em compreender o universo do PCP (os sindicatos, as autarquias, a memória da Reforma Agrária, etc.), enquanto o partido desconfia por natureza da informação controlada pelo “grande capital”. Assim, o PCP acaba a retratar-se a si próprio no Abril Abril, bastante inferior em grafismo e conteúdo ao portal do Bloco de Esquerda.
7. Porque o PCP poderia ser muito mais do que 30 velhos reunidos numa sala da antiga Associação de Amizade Portugal-URSS a confessarem que estão a dar em malucos porque a televisão não diz o que querem ouvir sobre a guerra na Ucrânia. O problema é que isto não é uma caricatura, é a reprodução de uma notícia do Avante! de 14 de Abril de 2022.
Ame-se: Os seus adversários estão em superioridade numérica? Isso é óptimo. Se um produto vende muito, só pode ser uma porcaria feita propositadamente para enganar consumidores pouco exigentes. Assim, tem a certeza de que a maioria só é a maioria porque é composta por pessoas mais ingénuas/menos inteligentes/mais submissas/menos sensíveis/mais ignorantes (não risque o que não interessa e some isto tudo) que você, a excepção à regra da acefalia. Esclarecido este ponto, suba ao pedestal que é seu por direito e observe com desdém a multidão lá em baixo. Como eles estão muito longe, não consegue ouvir nada do que dizem para além de um vago sussurro de indignação. Por isso, não precisa de debater, questionar as suas crenças ou sequer fundamentar aquilo que afirma: só tem de gritar para mostrar às formigas quem está certo. Há quem fale do conforto da multidão, mas estar em minoria faz maravilhas pela sua auto-estima.
Vitimize-se: Em certos países, vir para a rua criticar o discurso estatal pode fazê-lo ser preso ou viver outras experiências desagradáveis. Aqui em Portugal, contudo, é muito pior. Os carneiros da maioria podem dizer coisas feias sobre si, escrever textos a desmenti-lo, gozar consigo em programas de humor e até reagir com caras vermelhas aos seus posts no Facebook, afrontando o seu direito constitucional a só ouvir elogios ao brilho da sua análise. Em situações destas, recorra à História e faça comparações com ditaduras do século XX. O passado está lá para ser moldado ao nosso gosto e fornecer conteúdo para inúmeras equivalências. Censura, massacres, saneamentos, campos de concentração, gente a dizer que você está errado, é tudo igual. Mas há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não e depois põe o telemóvel a carregar.
Flutue: Se quem está no poder segue a opinião da maioria (ou, na sua perspectiva, manipula a maioria), não hesite em atacar as autoridades. Alguns recém-chegados ao minoritarismo acreditam por vezes que têm de apresentar uma proposta alternativa à política oficial, mas isso seria uma absurda perda de tempo. Tudo o que necessita é de salientar que os governantes não conseguem apresentar uma solução perfeita para o problema em causa apenas e só porque não dispõem das qualidades morais e intelectuais que caracterizam a sua personalidade e buscam mais poder, dinheiro ou outro objectivo inconfessado. De resto, criticar tudo evita a necessidade incómoda de tomar posição e correr o risco de perder. Se for preciso escolher um lado, proclame a sua neutralidade e justifique-a com os motivos mais nobres. Assim, poderá pairar tranquilamente sobre os acontecimentos e gozar a convicção de que nunca terá culpa de nada. Enquanto os tontos com bandeiras andam à bulha, você ganha sempre.
Crie o seu próprio mundo: Um dos grandes avanços do século XXI é o fim da obrigação de aceitar uma realidade dissonante das nossas crenças. Os parvos da maioria consomem a informação dos meios de comunicação tradicionais e acham que têm de formar as suas opiniões a partir daquilo. Você é mais esperto e sabe que encontrará algures na Internet a verdade a que tem direito, uma verdade que confirme as suas ideias. Frequente os sites certos e possuirá sempre dados irrefutáveis para esmagar os maioritaristas. Se não partilha as opiniões deles, porque haveria de partilhar os factos? Escolha um facto à sua medida e ande sempre confortável. Caso o ruído dos tansos suba de volume, recorra a uma arma pesada: um especialista. Uma pessoa dotada de um título antes do nome e que, ao contrário dos “avençados” com a mesma profissão, tenha a “coragem” de proclamar a “verdade” “escondida” pelos “poderosos” fornecer-lhe-á material para responder a qualquer crítica.
Faça amigos: Apesar de ser orgulhosamente minoritário, encontrará sempre alguém que pense da mesma maneira. Aí é que está a grande vantagem disto tudo. Integre um conjunto de pessoas com ideias semelhantes às suas e faça afirmações de que os outros membros gostem. Procure tornar-se a figura dominante do grupo, berrando mais alto que os outros e expulsando sem piedade aqueles que forem apanhados a ouvir os cantos de sereia do maioritarismo. Com um cuidadoso isolamento do exterior, a sua minoria parecerá uma vastíssima maioria e os ataques de quem está fora reforçarão a união de quem está dentro. Em nome da coesão interna, imponha um pensamento único apto a resistir ao “pensamento único” da maioria. Pense diferente e depois pense sempre igual.
1. A edição de 18 de Março de 1938 do jornal Os Sports noticia, na sua secção relativa a jogos particulares disputados em Lisboa, a realização no campo Francisco Lázaro de um encontro de futebol entre “o grupo representativo dos Serviços Industriais e um misto do Pessoal de Enfermagem, Raios X e Farmácia, dos Hospitais Civis de Lisboa”. A equipa dos Serviços Industriais venceu os colegas por 4-0, alinhando no 2-3-5 habitual à época com “Humberto; Porfírio e Saramago; Campos, A.A. Silva e Lourenço; A. Silva, Luís, Joaquim, Sebastião e Mangerico”.
Saramago, um dos defesas dos Serviços Industriais, seria José de Sousa Saramago, um serralheiro mecânico formado na Escola Industrial Afonso Domingues e contratado pelos Hospitais Civis de Lisboa em 1941 (esta data nem sempre coincide nas biografias do escritor)? É muito provável, mesmo que em Março de 1938 José Saramago ainda não trabalhasse formalmente para os Hospitais Civis de Lisboa. Apesar de ter então apenas 15 anos, José era já mais alto do que a maioria dos jovens portugueses da sua idade, característica física que o salvou de vestir a farda da Mocidade Portuguesa, mas seria interessante num futebolista a jogar no sector defensivo. O facto da partida espontânea entre funcionários dos HCL não se encontrar sob a alçada dos regulamentos da AFL permitiria que homens de diferentes idades coexistissem numa equipa ocasional e formada a partir das mais diversas circunstâncias do momento. Numa entrevista concedida em 1998 à revista A Bola Magazine (transcrita em Blimunda, n.º 2, 2012), Saramago recordou vagamente ter praticado um desporto “menos que amadorístico” em modalidades como o ténis, antes do jornalismo e da literatura concentrarem as suas atenções. O futebol não interessava particularmente a Saramago, que numa crónica escrita aquando do Mundial de 1986 considerou o desporto-rei um “sucedâneo da guerra”. Seria, por isso, irónica a localização num jornal desportivo da referência mais antiga na imprensa portuguesa ao autor de Memorial do Convento.
2. Entre as décadas de 50 e 90 do século XX, o Odivelas Futebol Clube praticou futebol no pelado do Campo Diogo José Gomes, o espaço de Odivelas (situado no actual Jardim da Música) onde conviveram gerações de adeptos “rubro-negros”. Alguns deles lembravam-se às vezes de perguntar quem tinha sido Diogo José Gomes, figura que a história oficial do OFC identificava como um guarda-redes do clube que, em data incerta, participara num jogo em Caneças interrompido por distúrbios com os adeptos locais, durante os quais Diogo fora atingido por uma pedrada cujo impacto lhe provocaria a morte e a preservação do seu nome na memória odivelense. Sabemos que esta história é um mito graças ao trabalho de Dario Ferreira Baptista, correspondente de Os Sports em Odivelas nos anos de 1931 e 1932. Nos textos sobre a actividade desportiva local que enviou então para Lisboa, Baptista referiu Diogo José Gomes, um futebolista de 18 anos do Odivelas Football Club que começara por jogar como interior direito mas destacara-se na posição de defesa direito, onde se tornou um dos melhores elementos da equipa odivelense. Gomes tinha a particularidade de, tal como Baptista, ser um dos poucos adeptos do Sporting em Odivelas, uma aldeia dominada por benfiquistas onde “a “alma vermelha” impera” (Os Sports, 16-11-1931). Em Novembro de 1931, Diogo José Gomes adoeceu com um problema de saúde não identificado, vindo a falecer semanas depois e a ser sepultado num funeral com a presença de “centenas de pessoas de todas as categorias sociais” (Os Sports, 21-12-1931). Por essa altura, a equipa infantil do Odivelas disputou em Caneças um desafio com a reserva do Clube Sportivo local no qual usou braçadeiras de luto pelo jovem Diogo, evento que terá estado na origem da lenda atrás referida.
O Odivelas Football Club vivia, tal como outras colectividades da periferia de Lisboa, em condições muito precárias, a começar pela falta de campo próprio, para o qual nenhum dos proprietários rurais da freguesia de Odivelas cedia um terreno. O clube depressa caiu num marasmo do qual procurou sair em Fevereiro de 1932 com a formação de duas comissões de sócios que tentariam recrutar novos jogadores e impulsionar a actividade desportiva. O último esforço terá falhado, a avaliar pela ausência de referências em Os Sports à prática do futebol em Odivelas nos anos seguintes, à excepção de uma breve notícia de Junho de 1937 que menciona duas partidas em Sacavém entre a colectividade dos operários da Fábrica de Loiça e o “Odivelas Sport Clube”, derrotado pelos sacavenenses quer em reservas quer em primeiras categorias (Os Sports, 28-06-1937). Em 28 de Maio de 1939, um grupo de rapazes (ainda muito novos, de acordo com a única fotografia conhecida da sua equipa) fundou o Odivelas Foot-Ball Club “Os Gatinhos”, uma nova associação que partilharia apenas parte do nome com o emblema activo no início da década. No entanto, a memória da morte precoce de Diogo José Gomes não se perdeu no reduzido meio desportivo odivelense e, embora com pormenores diluídos pelo tempo, perdurava ainda em 1952, quando o OFC, que possuía desde 1945 a designação e as características básicas mantidas até ao início do século XXI, construiu e inaugurou o recinto ao qual foi atribuído o nome do malogrado futebolista.
3. A 12 de Abril de 1934, o jornal regional A Voz do Concelho, então publicado em Loures, registou a ocorrência no campo do Grupo Sportivo da vila de um curioso desafio de futebol entre o “Grupo Desportivo” de Olival Basto e um conjunto de “rapazes de cor” naturais da cidade angolana de Moçâmedes (a actual Namibe). Com receita de bilheteira a reverter para os Bombeiros de Loures, o jogo tinha sido promovido por Alberto Matos Perdigão, antigo director de A Voz do Concelho e ligado quer ao Sportivo quer à corporação. Alguns meses depois, o encontro disputado em Loures foi referido em termos jocosos num artigo de um jornal de Moçâmedes cujo autor, A. Mota, teria afirmado “baboseiras sobre o povo saloio” que levaram Matos Perdigão a escrever sobre o contexto no qual decorrera a partida.
Perdigão ocupava o cargo de fiel do Matadouro Municipal (cujo edifício seria transformado meio século mais tarde no Centro Cultural da Malaposta), junto à Calçada de Carriche, onde fora abordado por um grupo de jovens de “entre 15 a 18 anos de idade” do povoado local que lhe pediram para obter junto dos dirigentes do GS Loures a cedência do campo de futebol. O objectivo dos rapazes era realizar um jogo “a título de brincadeira” com angolanos condutores de gado que “se encontravam alojados nuns barracões da firma V. Reis & C.ª, Lda.”. O recinto lourense estava vago na data pretendida devido a uma deslocação do GSL a Mafra, pelo que os jovens do Olival Basto se apresentaram na sede do concelho e cederam equipamentos aos adversários. Um número reduzido de pessoas assistiu ao “pseudo desafio”, motivo de risota pela inabilidade dos praticantes e após o qual o “Grupo de Carriche” ofereceu aos angolanos um cabaz com vinho e pão com chouriço. Em Moçâmedes, A. Mota revoltara-se com a ideia de que uma equipa de “cozinheiros” negros fora tomada como representante de uma cidade onde o desporto se encontrava já desenvolvido, ao que Perdigão respondeu com o carácter informal e caricato do jogo e a memória dos momentos em que convivera com os futebolistas ocasionais de Angola, por ele considerados, “apesar de vadios e selvagens”, mais educados que muitos brancos (A Voz do Concelho, 30-09-1934).
Este episódio levanta várias questões, a começar pelo seu efeito na prática futebolística no Olival Basto. Poderia tratar-se da origem do ainda activo Grupo Recreativo do Olival Basto (mais conhecido pela sigla GROB), fundado em Junho de 1937, mas sabe-se que, enquanto o GROB se dedicava nas suas primeiras décadas de vida sobretudo a actividades culturais e recreativas como um grupo de teatro e a exibição de cinema, existiu paralelamente um clube chamado Grupo Desportivo de Olival Basto, dissolvido antes de 1968 e cujos antigos membros cederam os respectivos bens ao GROB quando este se iniciou no futebol (Boletim GROB, Agosto de 1968). Por outro lado, quem eram Cambuta, Canivete, Saparalo e os outros pastores angolanos que jogaram futebol em Loures e em que circunstâncias vieram para a então Metrópole? Como viviam e trabalhavam nas proximidades da Calçada de Carriche? Fixaram-se por cá ou regressaram a Moçâmedes? Tantas dúvidas e mistérios por esclarecer a partir de um simples desafio de futebol que provocou gargalhadas em 1934.
11-10-1997: “ (…) Hoje jogaram Portugal e Irlanda do Norte. Mesmo que os lusos vencessem só se apurariam para o Mundial-98 se a Arménia vencesse a Ucrânia. Os resultados dos dois jogos foram: Portugal 1-0 Irlanda do Norte, Arménia 0-2 Ucrânia. Portanto, ficámos novamente a ver navios.”
31-10-1997: “ (…) A TVI difundiu uma notícia preocupante: a UNITA suspendeu o processo de paz e reuniu-se para determinar se regressa ou não à luta armada. A guerra em Angola não pode regressar! De qualquer maneira, eu acho que Jonas Savimbi apenas pensa em ter o poder; a sua sede de glória e força pessoal é a única coisa que o move. Já é tempo de alguém lhe dizer: “Basta!” (…)”
23-11-1997: “ (…) Houve remodelação no Governo. Para a Defesa e Presidência entrou Veiga Simões (sic), para a Economia Pina Moura, o Ministério da Administração Interna passou para as mãos de Jorge Coelho, assim como o do Emprego e Qualificação para Ferro Rodrigues. Foram criadas duas novas pastas: a dos Assuntos Parlamentares (inútil), com a qual ficou António Costa, e a do Desporto, Juventude e Combate à Toxicodependência, entregue a José Sócrates.”
14-12-1997: “ (…) Um caso curioso destas eleições (autárquicas) passou-se nos Covais (Pedrógão Grande). A avó (…) foi, juntamente com algumas vizinhas, levada à mesa de voto mais próxima por um homem que lhe disse para votar no PSD, o que ela fez, assim como as outras mulheres. Não admira que os sociais-democratas tenham ganho nesse município, com casos como este. Isto parece algo passado no século XIX! (…)”
24-05-1998: “ (…) O FC Porto venceu por 3-1 o Sp. Braga na final da Taça de Portugal, conseguindo assim a “dobradinha”. Viva, viva, viva o FCP, o seu presidente, Pinto da Costa, o seu treinador, António Oliveira, e todos os jogadores da equipa! Os feitos do Dragão já merecem uma epopeia.”
28-06-1998: “ (…) contra todas as sondagens e as próprias projecções das 19.00, o “não” venceu o referendo sobre a despenalização da IVG! (…) por apenas pouco mais de um ponto percentual, o “não” ganhou. Ver a festa que deveria ser do Movimento Sim Pela Tolerância a ser aproveitada estupidamente pelos partidários do “não” revoltou-me. Não era justo! “Sim” era a resposta certa. A ignorância e a dependência da Igreja dos portugueses talvez tenham deixado tudo na mesma por muito tempo. (…)”
08-10-1998: “ (…) José Saramago foi laureado com o Prémio Nobel da Literatura. Não concordo com as posições ateias dele, mas acho que este é um dia glorioso para a literatura portuguesa e para Portugal. 1998 é, de facto, o ano da prosperidade e do orgulho nacionais.”
07-09-1999: “ (…) Tenho pena de não ter comparecido na manifestação pró-Timor realizada em frente à Maternidade Alfredo da Costa. Estiveram lá cerca de 10 000 pessoas. Foi um momento histórico. Podia perfeitamente ter estado lá e não o fiz. (…) Acho que se a ONU ainda não fez nada para enviar uma força de manutenção da paz para Timor, nunca chegará a fazer. (…)”
18-09-1999: “Hoje choveu sem parar durante toda a tarde. As tropas da ONU iniciaram a libertação de Timor-Leste. (...)”
14-04-2000: “ (…) O barco do Governo começa a meter água, embora os buracos ainda possam ser tapados por Guterres.”
05-05-2000: “ (…) Houve um tempo em que o PS e o FCP pareciam imbatíveis. Será que está a começar uma nova época?”
01-09-2000: “ (…) Sempre que me ligo à Internet, fico lá imenso tempo. Não posso evitar essas horas, há demasiada informação ao meu dispor. (…) é como se me pusessem um frango inteiro na mesa e o tivesse de comer em cinco minutos. (…)”
1. Os comentários da direita sobre o fim do CDS têm sido semelhantes aos efeitos do fecho de uma loja antiga à qual não se vai há muito tempo. Lamentamos o facto, relembramos as compras que fizemos na loja e a malta que por lá passava e depois entramos no novo centro comercial onde tudo parece mais moderno.
2. Os primeiros resultados conhecidos das legislativas confirmaram a impressão surgida nas presidenciais e autárquicas de que parte do eleitorado tradicional do PSD e do CDS no país rural aderiu ao Chega. Em círculos como Leiria, o PSD perdeu por causa do Chega, um partido implantado em quase todo o território. Já no distrito de Lisboa, os “laranjas” ficaram abaixo dos 25%, enquanto Chega e Iniciativa Liberal registaram em conjunto mais de metade desse valor. Prossegue assim uma tendência iniciada ainda antes de Rui Rio e temporariamente disfarçada por Carlos Moedas: o PSD tem cada vez menos sucesso nos grandes centros urbanos e, nos antigos bastiões do Interior, já não são favas contadas. A direita cresce, sim, mas através das novas marcas lançadas no mercado. Qualquer futuro líder social-democrata terá um problema bicudo para resolver.
3. O voto útil no PS constituiu uma ameaça terrível para o Livre, mas Rui Tavares conseguiu o fundamental, ser eleito deputado. Uma câmara da ARTV apontada para o historiador, cujas capacidades oratórias melhoraram nos últimos anos, é suficiente para dar relevância política ao Livre, que apela insistentemente à entrada de novos militantes de modo a fazer crescer um partido ainda minúsculo e limitado às sete colinas de Lisboa. O enfraquecimento do Bloco representa uma oportunidade para os livres/livristas/verdinhos/tavaristas/papoilas saltitantes (têm de escolher um nome) ocuparem dentro da esquerda um terreno necessariamente reduzido, mas produtivo.
4. A substituição de Jerónimo de Sousa por um dos Joões acontecerá mais cedo ou mais tarde, mas o problema do PCP é bem mais profundo e resulta da inadaptação do centenário partido de Cunhal a uma época em que há cada vez menos operários e camponeses e o individualismo triunfa sobre o colectivismo. Claro que o PCP não vai desaparecer, mas tornou-se apenas um dos muitos partidos de nicho dotados de uma base fiel mas incapazes de atrair gente nova e diferente. No caso do Bloco de Esquerda, se Catarina Martins abandonar a coordenação, o que se seguirá? A oposição interna é mais radical e nostálgica do PREC que o establishment do Bloco, enquanto uma aclamação de Mariana Mortágua ou outra figura do grupo próximo de Francisco Louçã pouco mudará na prática. Desde o empate nas legislativas de 2019 que a direcção do BE hesita quanto ao caminho a escolher e comete erros de cálculo e discurso com consequências desastrosas. O resultado do BE em 30 de Janeiro foi tão mau que será difícil não fazer melhor da próxima vez, mas o contexto é muito diferente do de 2011. Depois da Iniciativa Liberal imitar o Bloco, como é que o BE poderá imitar a IL?
5. É arriscado fazer prognósticos sobre o futuro dos partidos dos novos grupos parlamentares. O Chega e a Iniciativa Liberal parecem ter tudo a seu favor, mas perder o efeito novidade e começar a fazer compromissos com vista a uma aproximação ao poder já deu cabo do PAN. Por enquanto, André Ventura alcançou o objectivo de transformar o Chega num imenso calhau colocado no meio da rua e impossível de contornar ao qual a direita tem de trepar para subir, enquanto João Cotrim de Figueiredo deu à IL uma imagem de força e dinamismo essencial para atrair os antigos quadros do CDS e jovens “talentosos” saídos das faculdades de economia. Apesar da líder da oposição ao terceiro Governo Costa ser Sandra Felgueiras, não faltará ruído no hemiciclo de S. Bento em torno dos múltiplos casos que certamente surgirão.
6. Se nenhum deles tiver um problema grave de saúde, Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa ficarão juntos no poder durante uma década completa, à imagem da história bem diferente de Mário Soares e Cavaco Silva. Serão os dois rostos principais de uma época da história portuguesa com características específicas, marcada por fenómenos como a recuperação económica do pós-troika, o impacto das redes sociais na política, os primeiros efeitos visíveis das alterações climáticas, a pandemia de covid-19 e todas as suas consequências com dimensões ainda por avaliar ou os eventos desconhecidos a ocorrer até 2026. Em resumo, dez anos repletos de coisas que nunca tinham acontecido. Voltando ao cavaquismo, é possível estabelecer outro paralelo. Antes de se tornar um anacronismo ambulante na sua fase presidencial, Cavaco foi entre 1985 e 1995 um líder popular em perfeita sintonia com o espírito do tempo (até gostava da série MacGyver). Da mesma forma, António Costa, com as suas qualidades e defeitos, será recordado como o primeiro-ministro que a maioria dos portugueses do período de 2015-2025 queria ou pelo menos tolerava, enquanto uma minoria o detestava com todas as forças. Nos anos 30, as preferências dos cidadãos poderão já ser completamente diferentes.
P.S. Comecei este blogue há cinco anos. Acertei quando compreendi que Rui Ramos tinha aberto a caixa de Pandora ao criar André Ventura. Errei ao achar que o PAN seria o partido do futuro. Pouco importa, o importante é continuar a dizer coisas, apesar da humidade.
O objectivo é escolher os dez melhores temas musicais criados para os genéricos de programas da televisão portuguesa. O facto de se tratar aqui de canções originais põe de parte todas as telenovelas nomeadas a partir de êxitos de Paulo Gonzo e outros artistas, assim como a presença nos créditos iniciais exclui composições como "É Tão Bom" (Sérgio Godinho/Jorge Constante Pereira), que fez parte da banda sonora da série da RTP "Os Amigos do Gaspar" sem surgir no respectivo genérico. A selecção e ordenação das músicas dependem de critérios totalmente subjectivos.
10. "Governo Sombra"/"Programa Cujo Nome..." (instrumental), SIC Notícias, 2020-
9. "Polícias" (instrumental de António Victorino de Almeida), RTP, 1996-1997
8. "Melhor do que Falecer" (Camané), TVI, 2014
7. "Zé Gato" (Pedro Brito), RTP, 1979-1980
6. "Casino Royal" (Herman José), RTP, 1990
5. "Zip-Zip" (instrumental do Quarteto 1111), RTP, 1969
4. "Pôr do Sol" (Toy), RTP, 2021-
3. "1986" (João Só, Catarina Salinas e Lena d'Água), RTP, 2018
2. "Arca de Noé" (Carlos Alberto Moniz), RTP, 1990-1995