Aí vamos nós outra vez (1)
(Até 18 de maio, teremos aqui todas as semanas breves notas sobre a campanha para as eleições legislativas, além de uma canção dos Ban)
1) As sondagens da empresa Aximage têm sido ignoradas, por razões óbvias: são encomendadas pelo Chega e divulgadas pelo partido na Folha Nacional e nas redes sociais. Contudo, os valores atribuídos por esses inquéritos às diferentes forças partidárias, incluindo o Chega, são verosímeis, com os estudos a apontarem cerca de 20% para a hoste de André Ventura a nível nacional e a preverem um segundo lugar do Chega no círculo de Setúbal, onde alcançaria uma ligeira vantagem sobre a AD. As tendências para a fragmentação da direita e o declínio do PSD na Grande Lisboa poderão levar a uma situação na qual Chega e Iniciativa Liberal tenham em conjunto mais votos que a AD. Simbolicamente, seria um marco importante.
2) Os inquéritos de opinião mais interessantes são aqueles que apresentam uma segmentação das intenções de voto por categorias como região, género, rendimento ou faixa etária dos eleitores que cedem alguns minutos do seu tempo às empresas de sondagens (costuma ser menos de um terço dos indivíduos contactados por telefone). É curioso, por exemplo, ver a AD liderar entre os idosos, fenómeno que há apenas dois anos era considerado impossível; afinal, como poderiam os “dependentes” do Estado votar contra o “socialismo”? Também não deixa de ser assinalável que o apoio ao Chega seja maior entre os portugueses nascidos na década de 80. Numa análise por regiões, um olhar atento sobre a Grande Lisboa, pelo menos tal como é delimitada nos estudos, dá sinais animadores para o Livre e aterradores para o Bloco de Esquerda. O regresso à ribalta dos fundadores do BE não deveria significar o recuo do partido para os números de 1999.
3) Numa entrevista ao Público, Francisco Louçã recorreu a uma sondagem para tentar provar o dinamismo do BE e, uns dez minutos depois, afirmou estar-se “nas tintas para as sondagens”. Com o avançar da idade, Louçã adquiriu uma memória bastante seletiva, sobretudo no que respeita aos eventos posteriores a 2020, acusando o Governo de maioria absoluta de António Costa de ter sido o “pai” do crescimento do Chega. Pois, aquele Governo que saiu das eleições de 2022, nas quais o Bloco caiu para cinco deputados enquanto o Chega passava de um para 12. Mesmo que o último executivo de Costa fosse tão desastroso como Louçã afirma e tivesse acabado no dia em que o então primeiro-ministro simplesmente se fartou de o ser, isso não explica porque foram os cheguistas e não os bloquistas a capitalizar o descontentamento social. De outra forma, Fernando Rosas, que recentemente acusou o PS de se “fazer de morto” no combate à extrema-direita, já tinha trilhado, no livro Direitas Velhas, Direitas Novas, um caminho de culpabilização dos socialistas e zero de autocrítica do Bloco. “Agora a culpa foi minha, não?!” Não, prof. Rosas, não foi sua. Na verdade, nesta altura do campeonato em que o Chega sonha erguer o troféu, parece ingénuo supor que tudo poderia ser diferente se alguém tivesse entrado pela porta 2 em vez de abrir a porta 1.
4) José Cardoso e os outros (desconhecidos) dirigentes do Partido Liberal Social têm tido dias muito ocupados no afã de encontrar candidatos, em particular mulheres, suficientes para o recém-legalizado partido apresentar listas ao sufrágio de 18 de maio, aproveitando a campanha para se dar a conhecer ao público. O projeto do PLS revela-se interessante, quanto mais não seja por ousar retornar ao velho costume de incluir a palavra “partido” no nome e querer ser conhecido por uma sigla. A ideia de uma IL mais moderada, ou uma espécie de Livre da direita, seria importante para contrariar a vaga polarizadora. Contudo, o programa do PLS é ainda vago, abundando em objetivos com que praticamente todos os cidadãos estarão de acordo. No que respeita à saúde, educação e habitação, os liberais sociais defendem a “liberdade de escolha” e acreditam nos efeitos positivos do reforço da oferta. Nesse aspeto, não há grande diferença em relação à Iniciativa, enquanto o restante conteúdo programático pouco clarifica quanto às novidades trazidas pelo cardosismo. Veremos se o PLS consegue pegar no megafone e começar a sua luta.
5) Com uma AD surpreendentemente confiante, predomina neste momento a ideia de que a votação de maio deixará o Parlamento idêntico, ou talvez ainda mais inclinado à direita. Os dois meses de campanha seriam assim, como Luís Montenegro os descreveu, um mero parênteses após o qual poderíamos voltar à rotina. É possível, ou então o povo português prepara-se para pregar outra partida aos políticos e comentadores. Um destes últimos, Marcelo Rebelo de Sousa, mostrou-se crente na relevância dos debates televisivos para a definição do sentido de voto da nação soberana. Enfim, não direi que os debates sejam inúteis, sobretudo para os partidos mais pequenos, cujos líderes necessitam de se destacarem mediaticamente. No entanto, fiquei traumatizado pelo debate de janeiro de 2022 entre Rui Rio e António Costa, alvo de uma antevisão televisiva semelhante à de um jogo da seleção de futebol e a seguir ao qual uma parte esmagadora da crítica declarou o triunfo de Rio. Depois viu-se como esse debate influiu na escolha do eleitorado.
6) A campanha das eleições autárquicas vai arrancando à mistura com a das legislativas, embora muitos dos candidatos a edis ainda estejam por anunciar. Há pouco tempo, o deputado Bruno Nunes (sim, aquele que um dia André Ventura terá de eliminar), candidato do Chega à Câmara de Loures, deu um salto a Odivelas para abraçar o seu correligionário Fernando Pedroso e filmar um alerta para a ameaça asiática. Nunes tirou algumas fotos com militantes do Chega – Odivelas perto da estação de metro da cidade.
(Fonte da imagem: Bruno Nunes)