Aí vamos nós outra vez (5)
25) É curioso que Cavaco Silva afirme ter procedido a uma “análise cuidada” dos programas e candidatos dos vários partidos antes de chegar à conclusão de que a AD e Luís Montenegro são as melhores opções. Sabemos bem que, caso um economista como Cavaco terminasse o estudo concluindo que a sua colega Mariana Mortágua, líder do Bloco de Esquerda, tinha “qualidades claramente superiores em matéria de competência técnica e política, em matéria de capacidade de liderança do Governo e de defesa dos interesses portugueses na União Europeia”, não deixaria de anunciar esse facto ao país e talvez gravar um vídeo de apoio para o Bloco publicar no Tik Tok.
26) Marcelo Rebelo de Sousa quebrou o silêncio sobre o apagão quando se encontrava na Pontinha. A fazer o quê? Apesar da peça da RTP sobre o tema mostrar Marcelo a descerrar uma placa, a observar vários documentos em exposição ou a dar autógrafos a um grupo de crianças, o áudio da reportagem não fornece qualquer informação acerca daquilo que o levou ao palco das suas declarações de 2 de maio. É preciso consultar as páginas nas redes sociais dos autarcas odivelenses para descobrir que o chefe de Estado veio ao Quartel da Pontinha assinalar a requalificação do Núcleo Museológico do Posto de Comando do MFA (coisa irrelevante, de facto). É certo que as antigas e sonolentas peças do tipo “Político inaugura obra” já não se usam, mas as televisões focam-se apenas nas reações dos entrevistados ao caso do dia e raramente esclarecem onde eles estão e para que fim. A cobertura das campanhas eleitorais torna-se uma sucessão de cabeças falantes que se prolonga enquanto as pessoas e o cenário atrás dos líderes partidários vão mudando sem ninguém sequer notar. Se é para isto, os candidatos poderiam ficar em casa e limitarem-se a intervir diariamente por videochamada.
27) Através do acórdão n.º 97/2025, de 4 de fevereiro de 2025, o Tribunal Constitucional decretou a extinção do partido Aliança, na sequência de uma ação intentada pelo Ministério Público devido à não apresentação das contas da Aliança durante três anos consecutivos. Desapareceu assim, de forma discreta, a formação partidária com a qual Pedro Santana Lopes pretendia em 2018 abanar o sistema. Na verdade, a Aliança nasceu afetada por uma contradição: que eleitor desejoso de mudança votaria em Santana Lopes, o político mais “do sistema” (à exceção de Marques Mendes) de Portugal? Apesar do congresso fundador da Aliança, em fevereiro de 2019, ter sido acompanhado em direto pelos canais noticiosos, Santana queixar-se-ia ao longo desse ano de não receber a atenção mediática que merecia. Na verdade, a Aliança, o partido com três hinos, era uma espécie de PSD B que parecia viver numa época longínqua em termos de comunicação, reagindo às notícias com longos comunicados publicados no Facebook. Depois dos aliancistas não elegerem qualquer deputado nas legislativas de 2019, Santana compreendeu que seria impossível concretizar a sua ideia de promover em Odivelas uma espécie de Festa do Avante da direita. O primeiro líder sairia do partido em janeiro de 2021, sucedendo-lhe Paulo Bento e, mais tarde, Jorge Nuno Sá, com o qual a Aliança passaria dos cerca de 40 500 votos de 2019 para os 2693 das legislativas de 2022. Por essa altura, a Aliança parecia tornar-se um partido “barriga de aluguer” semelhante ao Nós, Cidadãos, tendo passado por lá figuras como Ossanda Liber. No início de 2024, MPT e Aliança formaram a coligação Alternativa 21, encabeçada por Nuno Afonso, ex-amigo de André Ventura e antigo vice-presidente do Chega, mas o “produto tipo Chega” vendido por Afonso não teve sucesso. Um cartaz com o rosto de Nuno Afonso e a frase “Vamos Limpar a Direita Bacoca” foi então colocado na praça lisboeta do Saldanha… e continua lá, mais de um ano depois. A Aliança esfumou-se e o MPT aproximou-se da AD, mas tem de haver alguém que a Câmara de Lisboa possa obrigar a remover aquele trambolho.
28) O Partido Liberal Social, com listas de candidatos apresentadas nos círculos de Lisboa, Porto, Setúbal, Europa e Fora da Europa, divulgou no seu programa eleitoral algumas das medidas concretas que defende. Inevitavelmente, a tendência do (e)leitor é procurar as diferenças entre o PLS e a Iniciativa Liberal, visíveis nos países apontados como exemplos a seguir por Portugal: enquanto a IL elogiou inúmeras vezes a Irlanda e os países da Europa de Leste, os liberais sociais destacam sobretudo a Estónia, a Dinamarca e os Países Baixos. Também não se encontram no discurso do PLS referências constantes ao crescimento económico, a privatizações e à baixa de impostos, embora o partido acredite que a reorganização e descentralização da Administração Pública permitiriam reduzir a tributação. O “S” da sigla impele o PLS a afirmar que “ser liberal não significa abdicar do social” e o crescimento das despesas sociais não conduz necessariamente a uma expansão descontrolada do Estado. A digitalização é fundamental para os membros do PLS, que pretendem aplicá-la a todos os setores públicos, além de recorrerem a uma app para comunicarem entre si. Não cabe aqui enumerar as “12 Ideias para Mudar Portugal” dos liberais sociais, como o voto eletrónico, mas verifica-se uma aparente contradição. Apesar do modelo educativo do PLS atribuir “Autonomia Curricular e de Gestão” às escolas, os “agentes de mudança” comandados por José Cardoso querem incutir nos alunos características como “o espírito empreendedor, a capacidade de inovação e a responsabilidade social”, dar-lhes “literacia política”, treiná-los para o “pensamento crítico”, obrigá-los a estudar “Educação Ecológica” e divulgar “a literacia digital, a programação, a robótica, a inteligência artificial e a sustentabilidade” nos vários níveis de ensino. De facto, o PLS acredita no indivíduo, em particular no indivíduo formado pela Escola Liberal Social Avançada (ELSA).
(Fonte da imagem: Luís Montenegro)
29) Encontra-se disponível uma versão instrumental do hino de campanha do PS, “O Futuro É Já”, cujos autores são desconhecidos. Curiosamente, a canção fica bem melhor sem a letra, repleta de clichés e que parece gozar consigo própria (“Com o PS p’ra mudar, ah, ah”). Poderíamos extrapolar dizendo que os melhores líderes políticos são precisamente aqueles que fornecem o ritmo mas deixam os cidadãos escrever o seu próprio caminho. No entanto, isso seria talvez uma conclusão demasiado forçada.
30) Três candidatas com o apelido Salazar concorrem a estas eleições legislativas, mas nenhuma delas o faz apresentando-se nas listas do Chega ou do Ergue-te. Os eleitores poderão votar em Paula Colaço Salazar (PLS, Lisboa), Daniela Andreia Viola Ferreira Salazar (Livre, Évora) e Cláudia Sofia Andrade Salazar (PS, Porto).
31) Não é fácil para os partidos mais pequenos completar as listas aos círculos que elegem mais deputados, nomeadamente Lisboa e Porto, pelo que se torna comum o recurso a amigos e familiares das principais figuras dessas organizações para preencher as vagas em falta. No caso do PPM, porém, é demasiado nítido que os Bragança não são a única família relevante para os monárquicos. Os candidatos do partido pelo distrito do Porto incluem, além do cabeça de lista, António João Fontes Maia, mais três Maias. Outro clã importante no rol são os Stone, representados por Diego Schutz Stone e Graça de Odete Pimentel Vieira Stone. Há ainda cinco Amorins, quatro Emílios e três Domingos (Gregório, Maria João e Gregory Domingos), enquanto os Ferreira da Silva fornecem três candidatos. Já em Lisboa, surgem na lista do PPM cinco pessoas com os apelidos Câmara Pereira (há mais uma na lista de Beja e outra em Évora), mas famílias como os Abraços Estêvão (Susana, Sandra, Maria de Guadalupe, Amândio, José Maria e Fernando), os Pato (Maria Alexandra, Gabriel e Maria de Lurdes) ou os Muñoz (duas Marias do Carmo, Maria Leonor e Diogo) também estão presentes em força. Ninguém melhor que o PPM para dizer: “Mais do que um partido, somos uma grande família”.