Odivelas, que futuro?
Não se prevêem grandes novidades nas eleições autárquicas em Odivelas, até porque PS, CDU e BE apresentam os mesmos candidatos de 2017 (Hugo Martins, Painho Ferreira e Paulo Sousa, respectivamente) e Marco Pina, o rosto de uma coligação composta pelo PSD e por seis pequenos partidos (CDS, PPM, MPT, Aliança, PDR e RIR), não parece estar a gerar uma vaga de fundo semelhante àquela que quase levou Hernâni Carvalho à vitória em 2009. A maior incógnita diz respeito aos resultados dos estreantes Chega e Iniciativa Liberal. Embora o candidato cheguista à Câmara seja o empresário de 63 anos Nuno Beirão, parente de Francisco Sá Carneiro, a verdadeira estrela é Hugo Ernano, o célebre militar da GNR que matou uma criança cigana numa perseguição em 2008 e pode agora ser eleito deputado municipal. A IL apresenta uma lista encabeçada por Filipe de Sousa Martins, mas, como é habitual nos liberais, o candidato (uma “pessoa comum”) vê a sua individualidade anulada e limita-se a ser um pregador do programa eleitoral, no qual são referidas várias estruturas que seriam criadas pelo Município e exploradas por privados. Sem sondagens disponíveis, podemos apenas especular se o PS manterá a presidência de todas as juntas de freguesia, o PAN conseguirá ficar na Assembleia Municipal ou as novas forças à direita causarão rombos na votação de Pina. As redes sociais, onde predominam pessoas ligadas aos partidos e outras que desconfiam mal vêem um político a aproximar-se delas, não contribuem muito para o esclarecimento das tendências eleitorais. Para lá dos cartazes e dos ainda poucos folhetos difundidos, os candidatos fazem campanha através de visitas a instituições da sociedade civil (muito melhor que a sociedade militar) como IPSS, clubes ou congregações religiosas. Ignora-se até que ponto as restrições sanitárias permitirão contactos directos com o eleitorado na rua nas semanas anteriores a 26 de Setembro.
Em resumo, parece natural que se repita uma abstenção superior a 50%. Na verdade, o poder local, apesar da sua proximidade, costuma ser aquele que os odivelenses menos acompanham e escrutinam. A actividade das juntas de freguesia, centrada em funções essenciais ao quotidiano (limpeza das ruas, conservação de zonas verdes, assistência alimentar aos mais pobres, etc.) mas por isso mesmo banais, passa geralmente despercebida. Relativamente à CMO e à AMO, não existe muita informação para lá daquela que os próprios partidos e autarquias fornecem, devido à ausência de uma imprensa local credível e de um público disponível para consultá-la. A tradicional falta de espírito comunitário num concelho onde muitos habitantes vieram de outro município, país ou continente também não ajuda ao interesse pelas questões locais. A maioria dos cidadãos só contacta com as entidades autárquicas quando estas lhe fornecem algum serviço ou realizam projectos que interferem com o seu quotidiano. Por esse motivo, episódios recentes como as obras na Avenida D. Dinis e noutras artérias da sede de concelho ou o funcionamento do centro de vacinação no Pavilhão Multiusos (aquele onde Gouveia e Melo subiu para o tejadilho do carro) podem influenciar o sentido de voto da população que ainda se dirige às urnas.
Seria bom compreender como é heterogénea esta Odivelas já com 23 anos de governação autónoma. As ruas construídas por Tomás José Olaio que acolheram o crescimento populacional vertiginoso dos anos 60 e 70 parecem agora pertencer a uma época distante e até as torres de bairros como a Arroja e a Codivel sofrem a erosão do tempo. Surgidas já no século XXI, as Colinas do Cruzeiro tornaram-se uma cidade dentro da cidade e os colinenses são olhados por outros odivelenses com um misto de inveja e preconceito de classe. Pessoas muito diferentes ao nível da religião, do rendimento ou das qualificações fixaram-se em Odivelas devido às acessibilidades e aos preços da habitação, fazendo nascer gerações que cresceram numa terra em expansão quase contínua mas pouco consciente do seu passado. Sem fugir à sua condição de arrabalde, mas provando que o subúrbio não é todo igual, Odivelas oscila entre extremos e por vezes parece um microcosmos do país. Analisados em detalhe, os resultados eleitorais conhecidos já no dia 27 poderão ajudar a detectar a expressão política da pluralidade local.
P.S. Comprem na Churrasqueira Odimar, uma das lojas mais antigas de Odivelas. Estamos disponíveis para encomendas de partidos interessados em atrair eleitores ao Frango Liberal ou à Festa Socialista do Queijo de Nisa.